segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

a desenvoltura de um elefante

A partir de agora a população será apresentada à mais nova mentira da política nacional: a inauguração dos estádios da Copa -- em sua esmagadora maioria (honrosas exceções para gremistas e palmeirenses) financiadas com fartos recursos públicos. Obras gigantescas, moderníssimas, nos dão a impressão de que “sim, o Estado funciona quando quer”. Com grandiosidade e tecnologia, quem há de dizer que a gestão pública é sempre ineficiente e atrasada? Gasta-se alguns milhões a mais (sim, seria muita ingenuidade pensar que tudo é perfeito), mas vale a pena!

Mera ilusão.

Primeiro, é preciso que se diga: sim, o Estado pode ser eficaz. Existem milhares de exemplos no mundo onde os diversos governos provaram sua capacidade de atingir um determinado objetivo. Um exemplo bastante emblemático foi o lançamento do primeiro homem ao espaço, realizado em 1961, pelo governo da então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Naquele tempo, como sabemos, os Estados Unidos e a URSS disputavam a hegemonia do mundo sem confronto direto. E um país cuja economia era socialista, quase completamente planejada por um governo totalitário, levava o primeiro de nossa espécie aos espaços siderais. Pouca coisa? Claro que não.

Mas uma observação mais cuidadosa nos mostra aspectos relevantes de tais realizações. Enquanto Iuri Gagarin fazia seu passeio por sobre o planeta, seus compatriotas soviéticos lançavam as bases do que viria a ser o apogeu econômico do país. Com um planejamento centralizado e dirigido, mas inerte às reais necessidades da população, insensível ao lucro, e no qual o sistema de preços não poderia exercer sua principal função (que é o de informar aos agentes o quanto, quando, onde e como algo está sendo demandando e produzido) a economia daquela grande nação, tão exemplarmente dotada de recursos naturais e humanos, entra em colapso duas décadas depois.

Enquanto isso, do outro lado do mundo, o american way of life, além de foguetes e armas (ninguém é perfeito), produzia também liquidificadores, geladeiras, fogões, automóveis, telefones, rádios, e depois televisores e computadores pessoais. Além, é claro, de alimentos, roupas, remédios, casas, etc. Tudo isso para uma classe média que não parava de crescer. E o mais interessante é que não houve nenhum projeto governamental unificado, centralizado e dirigido para promover tão vasto crescimento. Somente um cenário onde os homens poderiam trabalhar livremente, e auferir os ganhos de esforço pessoal. Thomas Edison, Henry Ford, Michael Dell, entre dezenas de outros empreendedores, buscando maximizar seus lucros, e indiretamente contribuindo para o desenvolvimento de um país para onde milhares de pessoas migram até hoje em busca de uma vida melhor.

A conclusão a que chegamos é de que: sim, o Estado pode ser eficaz. Ele pode se propôr a atingir um determinado objetivo e poderá fazê-lo. Pode construir grandes obras, pode produzir tecnologia, pode até superar, em algum momento, as realizações de uma economia livre. Mas questão é: até quando? E uma segunda questão seria: e tais objetivos correspondem aos anseios da nação? A história nos mostra que os diversos governos, quando se propõem a implementar um projeto, eles o fazem bem até determinado momento. É relativamente fácil construir escolas e hospitais. Difícil é mantê-los funcionando. A gestão pública, por suas caracteristicas intrísecas, por sua própria natureza, é insensível às informações do sistema de preços, insensível ao mercado.

O destino dos estádios da Copa é o mesmo fatídico destino de qualquer escola ou hospital públicos: primeiro, a insuficiência; depois, a obsolescência; e por último, o sucateamento. Para evitar isso só há uma saída: a privatização. Ainda que apenas em parte (como costuma-se fazer: o setor de lojas, as praças de alimentação, os estacionamentos). Do contrário, teremos duas dezenas de elefantes brancos no país. Pela importância que o brasileiro dá ao futebol, muito mais que à Educação e à Saúde, é possível que pelo menos nesse setor tenhamos uma economia de mercado livre, ajudando a manter a manada em sua marcha.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

poder econômico vs poder político

A esquerda não entende que o poder econômico não é nada sem o poder político. Uma empresa com grande poder econômico só pode fazer uma coisa: comprar e vender seus bens e serviços. Ou seja, ainda vai depender das possibilidades e da vontade do outro. Além disso, não pode fazer mais nada. Ele não pode matar, não pode prender, não pode multar, não pode fazer absolutamente nada contra ninguém. A atitude mais "prejudicial" que uma grande empresa pode fazer é  contratar pessoas, dar empregos, baixar preços... enfim, tudo que beneficia a vida dos mais pobres.  

Até que tenhamos um outro poder, o político, legitimado pela democracia, instrumentalizado pela lei, executado pelas diversas polícias, agora sim, cooptado pelo econômico. Só assim que *algumas pessoas com poder econômico* agem deliberadamente contra alguém: através do poder político.

"O empreendedor não pode comprar favores de um burocrata que não tenha favores para vender" -- Sheldom Richman

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

lobo em pele de cordeiro

Tem um monstro embaixo da cama dos brasileiros. Trata-se de uma entidade malévola, que assola a população inflingindo-lhe males terríveis, que se tornam ainda mais terríveis por serem parcamente percebidos, pois a fera usa um manto mágico que a faz parecer mais das vezes benfazeja. Esse monstro se chama Controle de Preços.

Teve uma época em que políticas de preços controlados fizeram muito sucesso no Brasil. Quando o então presidente da república José Sarney se deparou com índices de inflação na casa dos 80% ao mês, sua equipe econômica, capitaneada pelo Ministro da Fazenda Dílson Funaro, não apenas idealizou como implementou uma medida revolucionária: o congelamento geral de preços. Vale ressaltar que não foi nenhum bando de aventureiros que engendrou tal política. Estamos falando de ministros, secretários, presidentes, doutores, mestres, todos balizados pelos mais altos estudos de nossa academia.

São coisas como essa que me levam a pensar que a genialidade pode estar nas coisas mais simples da vida. Por que ninguém havia pensado nisso antes? Ora, se os preços estão subindo em disparado, se nenhuma medida consegue garantir sua estabilidade, por que não decretar, por lei, o imediato congelamento de todos eles? A medida segue o mesmo raciocínio de uma criança que pergunta por que o governo simplesmente não imprime mais dinheiro para dar aos pobres e assim acabar rapidamente com a miséria.

Todos nós, brasileiros, que vimos os “fiscais do Sarney” dedurando o aumento criminoso do preço do detergente e do sabão em pó, que vimos gerentes de supermercados serem presos, que não precisávamos mais sair correndo pra gastar o salário e comprar tudo que podíamos (porque na outra semana o salário já não valia mais nada) sabemos bem a maravilha que foi o congelamento dos preços. Sabemos que durante alguns meses os preços baixaram, que o desemprego diminuiu, e sabemos que, depois disso tudo, a medida se mostrou um verdadeiro desastre. Não havia mais detergente nem sabão em pó nas gôndolas. Nem leite nem carne. Nem caro nem barato.

A teoria do conhecimento explica que existem basicamente duas formas de o ser humano aprender. Uma delas é pela lógica, pelas regras do raciocínio, da corretude do pensamento, chegando às conclusões a partir de premissas. Outra é pela experiência, pelo teste dos sentidos, vendo, ouvindo, sentindo. Pois bem. Tanto uma quanto a outra já provaram por a + b que controle de preços não funciona. Mas as pessoas insistem em praticá-lo. Temos preços controlados na grande maioria dos produtos e serviços ofertados pelo Mercado hoje em dia.

Um bom exemplo são os planos de Saúde. A ANS inclusive já fez uma declaração extremamente infeliz em que dizia que “ainda não tinha como controlar o preço dos planos, mas tinha como controlar quais serviços deveriam ser oferecidos”. Ou seja, a agência não só lamenta não poder determinar o preço de um plano, como também não percebe que já o faz, ao determinar que determinado pacote deva contemplar este ou aquele procedimento. Da última alteração que tive notícia, a agência obrigava as operadoras de plano de saúde a acrescentar 69 novos procedimentos, sem acréscimo dos valores cobrados. Ora, o que é isso, senão um controle indireto dos preços?

Outra vez ouvi pelo rádio que o governo estaria implementando um padrão de qualidade mínima para o café. Quer dizer, o cafeicultor seria obrigado a produzir com aquele grau de qualidade. Se não o fizesse, poderia ser multado, e até fechar as portas. Fazer café ruim seria proibido. O orador na tribuna explicava, em vão, que o preço do café não seria afetado por tal medida. Ora, meus amigos, ninguém aqui nasceu ontem. Primeiro, que repentina preocupação foi essa que o governo teve com a qualidade do nosso cafezinho? E que absurdo é esse de dizer que uma medida restritiva dessas não vai afetar o preço? É óbvio que vai. É óbvio que uma medida desse tipo é gerada por aqueles que podem implementar o tal plano de qualidade, visando proteger-se da concorrência dos que não podem. São os grandes que, através de lobistas, obrigam o povo a pagar mais caro, por lei.

Dos planos de saúde ao cafezinho, da gasolina ao sapato, da tarifa telefônica à conta de luz, quase todos os preços no Brasil tem algum grau (um bom grau) de controle. E o mais interessante: quando vemos os preços subirem, nós culpamos o Mercado. E pedimos um controle ainda maior do governo. Pedimos mais governo!

Algumas pessoas são como crianças diante de uma tomada. Algumas acreditam nos pais e nunca põem o dedo. Essas acreditam na lógica. Outras precisam testar a advertência, colocam o dedo, e sentem dor pra nunca mais. Mas tem pessoas que não aceitam nem o raciocínio nem a experiência, e insistem em fazer o errado. Essas são problemáticas. E, por último, tem aquelas que ao invés de colocar o dedo na tomada pedem pra colocar o SEU dedo.

Esses são os políticos.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

por que me tornei um liberal

Durante boa parte da minha vida eu fui de esquerda. Mas o que significa “ser de esquerda”? O esquerdista é, resumidamente, o cidadão que põe o coletivo acima do individual. E o faz por uma razão muito nobre: ele deseja o bem para a maioria das pessoas. Como vivemos num mundo onde a maioria das pessoas passa grandes dificuldades, enquanto uma minoria goza de uma vida tranquila, essa opinião parece sensata. É o sentimento cristão de fazer bem ao próximo, de dividir o pão, de compartilhar. É um sentimento bom e nobre. Infelizmente, o raciocínio está errado, e esse erro faz com que milhões de esquerdistas, em sua grande parte pessoas de bom coração e nobres intenções, trabalhem todos os dias para tornar a vida da maioria ainda mais difícil e sofrida. Eu, particularmente, continuo desejando o bem para todas as pessoas desse mundo – com relação a isso meu pensamento não mudou. O que mudou foi o caminho para se atingir esse ideal.

Tal mudança não se deu de forma rápida nem indolor. Quando tratamos do sofrimento das pessoas, o apelo emocional se torna inevitável. Era urgente a necessidade de achar razões para explicar esse estado de coisas e, talvez ainda mais importante, achar um inimigo contra o qual lutar – pois só assim seria possível ter esperança num futuro melhor. Para isso a escola marxista foi fundamental. É quase impossível dizer-se de esquerda hoje em dia sem defender algum grau de marxismo. Karl Marx foi quem compilou todo o edificio teórico que explicava tanto as razões desse mundo injusto e cruel, quanto a forma de superá-lo. Nos enormes quatro tomos de sua magna opus, o alemão explicava tudo. E para quem não tivesse coragem de ler O Capital por inteiro (como eu e como a grande maioria dos esquerdistas) ele ainda deixou sua versão “for dummies”, o panfleto incendiário do Manifesto do Partido Comunista.

Para o que pretendia provar, Marx foi genial: utilizou-se das maiores construções que o pensamento humano conseguiu produzir até então: a teoria econômica inglesa, o socialismo francês, o idealismo e o materialismo alemão... Smith, Ricardo, Saint-Simon, Proudhon, Hegel, Feuerbach, todos esses pensadores foram trabalhados com precisão pelo velho barbudo. Infelizmente ele escolheu suportar todo seu edifício em premissas falsas. Por exemplo, sua teoria do valor.

A teoria da mais-valia é um dos principais pilares do castelo marxista. Através deste conceito se explica a exploração econômica, e daí a atual luta de classes. Ocorre que essa teoria (e por consequência boa parte do castelo) parte de uma premissa equivocada, qual seja, a ideia de que o valor é proporcional ao tempo decorrido durante o trabalho necessário a se produzir determinado bem. A primeira refutação que nos ocorre é que o valor assim entendido teria de ser algo estático, cristalizado no objeto produzido. Uma análise mais cuidadosa (realizada posteriormente por críticos como Carl Menger e Ludwig von Mises) viria a demonstrar que o valor não é embutido no objeto, mas sim emprestado pelo sujeito, e por isso variável e dinâmico.

E assim poderíamos seguir analisando outros conceitos marxistas, até fazer ruir todo seu enorme edifício, tarefa que não cabe reproduzir aqui, até porque já foi muito melhor realizada por pensadores que vieram depois dele, cuja extensa literatura pode ser facilmente encontrada nas boas livrarias ou na internet. O que se precisa dizer, e se lamentar, é que o marxismo infelizmente ganhou ares de doutrina, tornando seus defensores pessoas extremamente fechadas, avessas a qualquer proposta crítica, quase dogmáticas. A teoria, que no primeiro momento deveria ser dialética, estacionou. Como isso aconteceu? Não sei. Arrisco supor que tenha sido pela introdução do elemento conspiratório na filosofia. Uma boa conspiração é aquela que não pode ser comprovada. Ela precisa estar sempre por perto, para de vez em quando preencher as lacunas e as inconsistências da ideia que se quer defender. Ao se propôr como “luta de classes”, é razoável se pensar que aqueles que criticam a teoria não o fazem tão somente pelo amor às ideias, pela grande vontade de se aproximar da verdade, mas sim pela vil razão de possuir interesses escusos, de ser beneficiado pela manutenção do status quo. O crítico do marxismo então seria, necessariamente, alguém que estivesse contra as classes trabalhadoras, alguém que pertencesse à burguesia, ou que dela dependesse. O nó estava bem dado.

O mais interessante da suposta “conspiração” contra a classe trabalhadora, é que ela é sempre a principal beneficiada com o abandono das políticas de cunho coletivista, e os países de mercado mais aberto fazem fila para provar. E como se não bastasse, o status quo é ferrenhamente defendido por todos aqueles que em tese provocam o grande mau das massas menos favorecidas. No mundo, as grandes corporações. No Brasil, grandes empresários como Eike Batista e Abílio Diniz defendem com unhas e dentes o grande poder concentrado nas mãos do governo, em nome dos mais nobres “interesses populares”.

É essa a doutrina que grassa na sociedade brasileira. A teoria marxista é exaustivamente trabalhada na grande maioria das ciências humanas, tendo cada um deles seu grande expoente. Exemplos não faltam: na Pedagogia, Paulo Freire; na Sociologia, Florestan Fernandes; na Filosofia, Marilena Chauí; na Arquitetura, Oscar Niemeyer.. e por aí vai. E se a teoria já é estudada sem a devida crítica no meio acadêmico, que é o centro formador de opinião por excelência, irradia-se dele uma doutrinação ainda mais forte e bem menos crítica na forma de produtores culturais que vão desde editoras como a Paz e Terra até nossos professores de Geografia e História do colégio.

Conclusão: é muito fácil não ser liberal no Brasil. Para sê-lo, é preciso nadar contra a corrente. É preciso manter a curiosidade acesa apesar do mistério apaziguante das conspirações e da esperança cativada pela emoção revolucionária. É preciso duvidar dos “bons”, e emprestar os ouvidos aos “maus”, e estar disposto a abandonar, se necessário, antigas ideias, antigos costumes, antigos amigos. Não é nada fácil. É tão difícil que às vezes me pergunto por que me tornei um liberal, se minha vida teria sido muito melhor se pudesse optar por não sê-lo.